Sonhos Platônicos

domingo, novembro 26, 2006

... de verdade.


Os olhos embaçados enxergam o escuro. Vultos. Lágrimas grossas escorrem face à baixo e o gosto salgado na língua lembra-lhe o mar. Ele ouve os gritos desesperados e algo perdido nas cinzas lhe chama a acordar, levantar-se, fazer alguma coisa. Ele não entende. Suas mãos estão mortas. Suas pernas estão mortas. O coração. Na garganta o intruso lhe sufoca a fala, dificulta a respiração, rouba o fôlego. A dor, substantivo nunca abstrato.

Um turbilhão de imagens confusas atropela pensamentos, lembranças. O tempo não tem mais sentido e o que foi, é, será: sendo. Ele está parado em frente à porta. É noite e há certa dificuldade em reconhecer a chave de casa. A luz da lua é branca como o leite que tomava no café da manhã, pouco antes do filho sair de casa, batendo a porta. Quando? Hoje? Ontem? Sempre?

A garagem está vazia. Alguém saiu de casa. A chave erra a fechadura e ele está caído aos pés da escada. Mal consegue levantar-se e, desistindo, deitado permanece numa enorme poça de vômito. Ele ri. Sem motivo, sem vontade.

Olha para o lado e vê a mulher. Ela corre em sua direção com algo na mão. Ele não reconhece o que é e ela o beija longa e demoradamente. Um abraço forte, um amor profundo, lúcido, vivo. Ele não reconhece aquele abraço, o contato é estranho. Ela está grávida e o um intruso na garganta explode em felicidade. Pode ser assim? Pode o ser eternamente feliz ser? As palavras se repetem e as perguntas não têm respostas.

A mão na boca sufoca o choro. Segura o intruso em seu esconderijo. Ele a ouve: os gritos, o pranto. Sente no rosto o calor úmido das lágrimas. O gosto salgado na língua. Sabe que ela está ali, mas não tem coragem de levantar os olhos. A dor não precisa de testemunhas.

A cabeça dói e a luz do sol ofusca-lhe a vista. Ela saiu para andar na areia. Ele vê o menino brincando na água e vira o rosto. Enche o copo e sorri para uma garota que passa. Ela é linda como em seus sonhos. Do alto do altar ele olha para a igreja lotada, os amigos, os parentes e pensa que não poderia ser mais feliz.

- Você promete?

A resposta é sim. Sempre o sim.

- Mais uma, doutor?

- A vai, a saideira?

- Vai sair pra beber de novo?

- Olha pra mim... ele só tem saudades do pai.

Ele acorda aos pés da escada com o telefone tocando. Ouve o grito. O choro. Levanta-se com dificuldade. Quando os degraus haviam ficado tão altos? A luz do quarto está acesa. No chão, ela chora. Ele pega o telefone. Do outro lado da linha ouve o homem dizer-lhe que o menino está morto. O coração sente o que os ouvidos não querem escutar. Ele cai. Joelhos no chão. Abre os olhos e a criança chora deitada ao seu lado. Ele ri. Sem motivo. Sem vontade.

sábado, novembro 25, 2006

... o que importa ...


Os olhos embaçados vêem o mundo girar à sua volta. A graça está em toda parte: da cor do céu ao cheiro da madrugada.

- Cara, você tem certeza que ta bem pra dirigir? Acho melhor eu levar o carro...

- Não! Eu tô bem, larga mão! Nunca me senti melhor!!!

As risadas saem descontroladas, carregadas de uma falsidade tão real que a ninguém contagia. Os outros olham-se por um instante: “Que se dane!” É o que os olhares dizem após um segundo de hesitação. As gargalhadas agora são gerais. Todos riem. Sabem que na manhã seguinte de nada se lembrarão e a certeza lhes confere um sentimento de poder: Poder fazer o que se desejar fazer. Invencibilidade imaginária. A vida na lata do lixo do subconsciente.

Gira-se a chave, o motor desperta. O tranco da guinada é forte e os passageiros gritam, algazarra total. Os pneus cantam alucinados e o carro parte veloz.

As luzes da rua passam rápido nas janelas. Quem se importa? A alegria proporcionada por aquele momento importa. Viver importa? Talvez. Não agora. Sim. Esse é o momento em que não se pára pra pensar nessas coisas. Ou em qualquer outras. Não se pensa, se age. E se ri: Muito.

A lua vigia de cima o veículo em movimento e em seu cuidado preocupado, tenta iluminar o caminho. A rua está deserta exceto por alguns vultos cobertos em mantos de escuridão espalhados sob os toldos das lojas fechadas. Dentro do carro o redemoinho de escuridão e seu hospedeiro bloqueiam a razão. A mão no volante esqueceu-se do sentido do verbo e o dirigir nunca esteve tão longe do guiar. Quem se importa?

A música alta no rádio termina.

- Põe outra música aê!

- Isso, troca essa porcaria!

O passageiro ao lado do motorista procura no player atender aos pedidos. São tantas as vozes que ninguém ouve ninguém e a algazarra termina, como sempre, em discussão. Confusão. Xingamentos. Empurrões. Na rua, um asfalto repleto de falhas desfaz linhas retas, confunde horizontes.

A seqüência de fatos se descortina rápida demais. Uma série de causas, como peças de quebra-cabeças, juntam-se construindo uma única conseqüência óbvia, irremediável.

Os olhos embaçados vêem o mundo girar. E ele gira mesmo. Quem se importa?

sábado, novembro 18, 2006

Sete Horas...


O dia vai se despedindo no horizonte e por entre os prédios, a luz do sol se entrelaça, abraçando o concreto num terno gesto de adeus. O ônibus lotado disputa espaço entre veículos menores numa eterna luta em meio ao trânsito caótico de fim de tarde da grande cidade. Sozinho entre tantos passageiros encontra-se um certo senhor José, 70 anos de idade e uma vida inteira repleta de banalidades pelas costas.

Nesse momento, a única coisa com que se preocupa o senhor José, que não lhe sai da cabeça, é o horário. A bem da verdade, aos olhos de pessoas normais essa dita preocupação não passaria de uma frivolidade, uma tolice mesmo. No entanto, para o senhor José, tal preocupação se mostra como algo de suma importância, assim como por exemplo o é, para o toureiro, os olhos do touro conseguir fixar.

As sete horas se aproximam. O ar condicionado do ônibus funciona a plena carga, mas o excesso de pessoas aglomeradas, torna o ambiente irremediavelmente quente e abafado. A tensão pelo avançado da hora faz brotar, entretanto, pequenas gotas de um suor gelado na testa do senhor José. Ele cogita nervosamente que, se saltasse no próximo ponto e à pé fizesse o restante do caminho, provavelmente chegaria mais rápido em casa. Com esforço puxa a corda dando o sinal. O veículo pára e o senhor José salta, aterrissando desajeitado na calçada.

Excitado com a carga de adrenalina que agora corre por suas veias, o senhor José olha no relógio. 6:45. Quinze minutos. Rapidamente ele imagina as melhores opções. Um enorme mapa preto e branco com opções destacadas em amarelo e um grande X vermelho apontando o local do tesouro aparece em sua mente. Milhões de cálculos rápidos são feitos e o resultado se mostra claro. Sem se demorar mais, o senhor José sai caminhando em passo acelerado, rua acima.

A avenida principal encontra-se congestionada por um mundo de carros e pessoas. Os corpos passam chocando-se uns contra os outros num ritmo ao mesmo tempo frenético e ritmado. A cidade pulsa como o peito de um grande mostro inanimado que dorme com a chegada das estrelas. O senhor José quer sair dali. Quer sair daquele mundo. Os ponteiros do relógio não param e tudo o que ele deseja é chegar em casa, entrar no único mundo que lhe pertence e livrar-se da solidão dessas ruas cheias de gente.

Algumas esquinas e avenidas depois, o senhor José finalmente chega à sua rua. Nesse momento ele já começa a sentir-se mais em casa. Lá no fim da rua, à direita, num ponto escuro onde à muito existia uma lâmpada em um poste, está o seu objetivo: O grande X vermelho. Ele olha no relógio. 6:55. Vai dar tempo. Pode até mesmo andar um pouco mais devagar. Não muito.

Andando agora com mais calma o senhor José observa as casas ao redor. Nessa vive uma família inteira: Pai, mãe e três filhos pequenos, de dois, quatro e nove anos. São três crianças lindas, mas ele não gosta de crianças, nunca gostou. O senhor José nunca teve filhos.

Mais à frente mora um casal. Dois velhinhos com idades parecidas com a sua. Mesmo nunca tendo se casado, o senhor José não entende como um homem e uma mulher podem viver juntos por tanto tempo. Ele não entende os relacionamentos. Por toda a vida preferiu se privar de tais incertezas em nome da segurança, do equilíbrio. O senhor José acredita piamente que relacionamentos só trazem dor e desilusão.

Apesar do horário, pode-se ouvir os ruídos das televisões ligadas, das conversas dos casais, dos pais, dos filhos, dos abraços, dos beijos, sorrisos. Famílias reunidas. Luzes. Cores.

O grande X vermelho é uma casa pequena, antiga, envolta em escuridão. O senhor José abre a porta, apressado. Olha no relógio: 7:00. É tempo. As luzes apagadas e o silêncio total o evolvem, espessos. Ele caminha em direção a sala e acende a luz. Olha em volta. Equilíbrio. Segurança. Seu grande sonho de consumo. São sete horas e um minuto e o senhor José senta-se na poltrona ansioso, tira os sapatos, alcança o controle remoto e liga a televisão. O jornal da noite vai começar.


quinta-feira, novembro 16, 2006






Piada é rir da própria vida.
Ri do teu erro, do que te agoniou semana passada. Sofra, mergulhe no mais profundo da dor pra quando sair, sair de alma lavada.
A música é desafinada?? Mais não deixou de ser música. afina a música, desafina a vida.
Desafia a vida...
Toma ela pela mão, tira pra dançar. A sua música desafinada. desafina a música, afina a vida.
Renova as alegrias, renova as dores. faz outra música, troca uma nota. Que tal um Sol?
O Sol brilha lá fora. Um Raul na vitrola.
Rimou? Faça rimas, as suas rimas. Rima o teu sorriso com alguma alegria.
E onde ficam os problemas? Logo ali...na puta que o pariu. Com eles é assim. Bate de frente. Pare de fugir. Funciona.
A vida não é tão fácil assim? Alguém disse por ai "viver é um barato agente é que acha caro".
Genial...
Não para de sonhar não. Facilita pra vida, facilita o sonho, é só querer.
Chora que é força, mais não esqueça de sorrir.
Sorrir é leveza...
Troque a caixinha de música por um disco do led zeppelin.
E por fim só uma palavra voando, abre a janela, e refletindo sobre o brilho do Sol (aquele que antes brilhou ali em cima) ganhou os ares e foi ser mais uma estrela por ai.
Permita-se...

segunda-feira, novembro 13, 2006

Triste Canção


Piada é ser coadjuvante da sua própria história.
Viver escondida entre os armários, socada nas gavetas da ilusão. Aquela que escondida desmancha os sonhos e faz a crueldade ilusória o seu prato principal.
A janela continua fechada. Nem um feixe solar entra, nem uma gota de escuridão sai.
Tudo se mistura, numa mescla enfeitiçada, sozinha.
Ela tenta encontrar a chave do cadeado da solidão. Tenta abrir seus olhos para imaginação.
Disca um número qualquer afim de ouvir uma voz aconchegante do outro lado da linha, quem sabe se confortar, mas ouve esse telefone não está disponível no momento.
Entrega-se aos fatos reais, as lembranças de uma história não vivida.
Volta para o armário, esconde-se na caixinha de música e dela sai a mais triste canção...

domingo, novembro 12, 2006

Caminhos


Não sei dos meus caminhos. Se são certos ou errados, lembrando que se perder também é um caminho. Por onde passo deixo minhas pegadas e junto com elas um pouco de mim.
Já deixei muito de mim por ai assim como levei outras tantas coisas.
Ahhh! As relações pessoais, assunto complexo prinicipalmente o amor e seus tantos dêmonios.
Mais voltemos aos caminhos, as pegadas , as marcas na areia ou na terra molhada que na próxima chuva irão desaparecer. Pegadas essas que apenas desaparecem em existência mais ficam vivas na memória e junto com essas pegadas uma foto, um sorriso, e tantas outras coisas quem podem marcar a vida de alguém. Com certeza valem muito mais que ter os pés no concreto da calçada da fama.
As vezes quero me dividir pra poder seguir por todos os caminhos possíveis, por vezes tenho acreditado não estar no caminho certo. Mais qual o caminho certo? existe um certo ou errado pra isso? Pensamentos desconexos leitores?
Se perder é um caminho.
Quero me perder aqui entre palavras, sonhos escritos, ou até mesmo me achar de mãos dadas com uma letra do alfabeto ou deitado em alguma palavra. confuso?
Se perder é um caminho.
Me perder entre imagens, saudades e abraços entre os beijos que ainda não foram dados.
Se perder é um caminho.
Me perder na rua. Ser meu próprio guia.
Me perder e deixar alguém me encontrar....

quarta-feira, novembro 01, 2006



É tarde. Uma sala, quatro amigos, cigarros e coca-cola. Assuntos dos mais variados, lembranças.
É bom compartilhar lembranças com amigos.
E entre as bricadeiras coisas sérias ditas por homens não tão sérios assim. Deus, filosofia, amor, conselhos e provérbios orientais feitos na hora. A coca acabou...alguém faz café? Ei acende um cigarro pra mim também?
Rilke, Neruda, Pessoa surgem na madrugada e novamente as coisas ficam sérias, no entanto sem perder a leveza de uma conversa entre amigos.
Mais q amigos...
Ali encontrei uma nova família, ganhei irmãos de verdade que não me deixam abandonar a briga, que não me deixam esquecer que a felicidade pode estar em um orelhão cheio d'água, numa piada ou até num jogo de baralho, e sempre me lembram que o ser humano pode escolher seus caminhos e tudo está sujeito a mudanças. desconstrução...
8 horas da manhã.Alguém pode fazer mais café??