Sonhos Platônicos

quarta-feira, março 29, 2006

Devaneios Imaginários


O encanto se desencanta.
As horas passam e passando nada acontece.
Pra onde foi o afeto?
Em algum lugar escondido está a passear o acalanto.
A esperança encontra-se batendo papo com a tristeza, aconselhando esse pequeno e poderoso sentimento a enxugar as lágrimas e colocar no rosto um singelo sorriso.
Estranho!
Se a tristeza distribuir sorrisos, onde está a tristeza?
Acordo...
Descubro que ao encanto se desencantar, o pego passeando com alegria que deslumbrada esta e não para de distribuir doces sorrisos.
O afeto se enamorou pelo arco-íris, a esperança o acompanha em todas as horas, esperando mais um momento do encontro sol e chuva.
Tristeza resolve seguir conselhos de dona Esperança, de vez em quando lágrimas rolam de seu rostinho, escorregando no choro, mas não demora para um sorriso tímido aparecer.
Passando por aí, em algum lugar da hora, o minuto muda e ao mudar um instante, tudo muda e nada acontece.
Um nó esta prestes a ser desatado.
E todos nem se tocam que em um instante milhares de coisas acontecem e mesmo assim tudo continua na mesmice dos lugares.


"Só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos."
Extraído do livro O pequeno príncipe

segunda-feira, março 27, 2006

Copo de Café..

Um copo de café,
Uma fatia de pão com manteiga,
Um bom dia vida pra despertar.
Olhar para a janela e ver o azul clarinho do céu.
O sol que nasce amarelo vivo cegando os olhos.
Os pássaros que vão voando tranqüilos,
Rumo a onde ninguém sabe.

Vestir a roupa devagar,
Escovar os dentes devagar,
Lavar o rosto devagar.
Olhar no relógio e constatar o óbvio.

Procurar as chaves de casa,
O celular, a bolsa.
Esquecer alguma coisa em cima da mesa.
Alguma coisa importante,
Que estava lá pra não ser esquecida.

Errar o buraco da fechadura,
Uma, duas vezes.
Acertar.
Abrir a porta,
Sentir o mundo entrar por você,
E você entrar pelo mundo.
Descer as escadas correndo.
Tentando lembrar,
Mas ainda esquecendo o que está na mesa.

Abrir a porta da rua,
Aterrissar na calçada, pouso forçado.
Dar partida,
Engatar marcha,
Partir veloz,
Fritando sola de tênis no asfalto.

Olhar os olhos que passam,
Ler neles noites mal dormidas,
Copos de café,
Fatias de pão com manteiga,
Relógios gritando atraso,
Chaves, celulares e bolsas perdidas,
Sonhos perdidos.
Pressa, sempre a pressa,
Alguma coisa muito importante sobre a mesa.
Lá, onde jamais seria esquecida.


São 5:05 da manhã.. Bom dia a todos!!

quarta-feira, março 22, 2006

Migalhas...

Espero não ofender ninguém com isso aí. Posso ser clichê, mas não sou de se jogar fora vai...

Entender o ser humano é provavelmente a tarefa mais difícil a que alguém pode se propor. Não digo entender atitudes, ações, não é isso. Me refiro a entender o que vai no íntimo de cada um. Os pensamentos que levam alguém a propor ou agir de uma certa maneira. A fazer coisas que não condizem com aquilo que pregam. O ser humano é o ser mais enigmático do Universo. Fomos nós que tivemos a ousadia de desafiar o Criador nos jardins de Sua própria morada. Somos nós que em nome da liberdade, e é nesse ponto que se encontra a maior injustiça humana, pois é sobre ela, a liberdade, que jogamos a culpa por todas as besteiras que fazemos, insistimos em erros absurdos e muitas vezes infantis.
Como entender um ser que teima em não aprender com as próprias ações? Diferentemente de qualquer outro ser vivo em nosso planeta, somos nós os únicos que vêem lógica e inteligência em repetir velhas ações que, sabemos, desencadearão conseqüências muitas vezes desagradáveis, como se pelo simples prazer de dizer que é para isso que somos livres. Pois eu digo que não. Arrisco dizer que a liberdade não foi idealizada para esse fim. Ela nasceu no desejo de mudar, de não ter limites, ela existe para que possamos encontrar novos caminhos, pensar o novo e fugir do velho. A liberdade é uma migalha de pão na trilha da vida, que nos guia de volta à felicidade perdida.
É nesse ponto que minhas tentativas de entender o pensamento humano se confundem. Por que optar sempre pelo caminho mais difícil? Porque experimentar os resultados de nossos erros em nós mesmos ao invés de espelhar-se no exemplo de alguém? Gostamos de sentir na boca o gosto amargo mas real da derrota. Não gostamos de conselhos. Os pedimos apenas para alimentar nossa ânsia masoquista de saber que havia uma rota alternativa que da próxima vez talvez tomaremos. O orgulho impede que aceitemos que nos digam o que fazer. Orgulho ou burrice? O ser humano é o ser mais burro do Universo.
Me interesso sinceramente por tentar entender. Não me incomodo jamais em perder um pouco do meu tempo nessa árdua tarefa. Faço isso na tentativa de ajudar, de ser útil para alguém num sentido mais amplo, mais completo. Penso que se um dia puder entender ao menos uma migalha do que é, ou melhor, do que pensa o ser humano, vou poder ajudar muita gente a encontrar o verdadeiro sentido da liberdade e, dessa forma, a trilha que os leva de volta à sua felicidade. Quem sabe nesse dia, nesse belo dia, possa encontrar a minha própria trilha, esperando que até lá, nenhum passarinho maldoso coma as migalhas de pão que espalhei pelo caminho.

Abraços a todos!!

"Da luta não me retiro.. Me atiro do alto e que me atirem no peito.. Da luta não me retiro.." (Anitelli)

sexta-feira, março 17, 2006

Voar...


Primeiro dia de aula, último ano de faculdade de engenharia e uma vontade danada de mudar de ares...

A janela aberta deixa entrar na sala um vento de início de outono, que vasculha as carteiras da sala fazendo voar papéis e transparências no retroprojetor. De novo. Aula depois do almoço após três meses de férias não é exatamente algo que aprecie muito. Lá na frente o professor parece empolgado com transistores, resistores, reguladores e mais uma série de outras dores. Meus pensamentos ainda não entraram na sala. Estão vagando lá fora, talvez sentados nos bancos do jardim da faculdade, conversando com os amigos que não via a algum tempo. Talvez em casa, ao computador ouvindo músicas novas, escrevendo o novo com as mesmas antigas palavras desbotadas. Talvez ainda mais longe. Em casa. Na minha casa, que guarda o que há de mais vivo no meu coração. Nos amigos que deixei pra trás, mas que estão sempre comigo, escondidos no bolso da camisa, bem junto de onde importa.

Sentado numa carteira encostada na janela minha vontade é de imitar Ramón Sampedro do filme Mar Adentro: Levantar da cadeira, limpar o caminho, pegar uma certa distância e num impulso pular pra fora. Sair voando, flutuando por sobre cabeças cheias de lógica e por vezes vazias de sensibilidade. Ver lá de cima as elevações do Vale do Paraíba, os carros e caminhões na estrada ansiosos em chegar a seus destinos. Chegar à minha cidade e ir direto àqueles que amo, fazer-lhes uma rápida visita. O suficiente para que saibam que mesmo tendo todos os lugares do mundo ao meu alcance, é com eles que quero estar. Nunca devemos perder uma oportunidade mesmo que pequena de demonstrar isso.

Quem me dera talvez voar no tempo par dar uma espiada no que tem lá frente. Uma espiada só não faz mal a ninguém.

O professor me pergunta alguma coisa que me traz de volta pra sala. Nem ouvi qual foi a pergunta, mas a resposta é não, quando deveria ser: “Não sei professor, estou mesmo precisando de um regulador pra me por nos eixos de novo. Pelo menos pra me trazer de volta dos sonhos”.

O vento fresco de início de outono entra pela janela derrubando a transparência no retroprojetor. De novo. Alguém oferece o estojo como peso. Transistores, Resistores, Reguladores, e tantas outras dores...

Aliás uma só: A Saudade.

ps.: Meu Deus é tão bom que nunca me deixa perder as esperanças...

quarta-feira, março 15, 2006

Tentando colorir o que é colorido, mas enxergando preto e branco


Acordo dou um salto e corro, abro a porta do banheiro e rapidamente me encontro debaixo do chuveiro observando o nascer do sol pela pequena janela. Meus pensamentos voam para algum lugar do espaço tentando encontrar uma saída para tudo o que me encanta e atormenta. Quando me dou conta, estou atrasada. Enfio a primeira roupa que encontro e lá se vão os pensamentos e a preocupação toma conta do espaço. São seis e quarenta, ônibus lotado, faces tristes outras alegres indo para algum lugar da cidade, uns vão trabalhar, outros estudar sem contar aqueles que saem bem cedinho esperando encontrar um emprego. Quem sabe?

Muitos ali estão em busca dos sonhos, que parece terem se perdido em algum lugar da vida sofrida, deixando marcas por onde passam.

Como queria poder tirar toda a dor e pranto e no lugar enchê-los de alegria e esperança. O meu ponto chega e desço, deixando de lado a companhia desses rostos que tanto me encantam e me preocupam.

Uma mistura de sensações, sentimentos toma o meu dia, a segunda – feira que parecia ser mais um dia normal, não é. A cada lugar que passo, algo deixa de fazer sentido e a vontade de gritar para todo mundo que ainda existe esperança, ela mora bem ao lado, muitas vezes chega atrasada, mas ela não deixa de existir e muito menos de olhar por nós. Cresce e conforme o seu crescimento meu peito parece explodir. Não explode, chego em casa, tudo tranqüilo. Sento na cadeira e olho para a tela do meu computador, pensando incessantemente sobre tudo o que ocorreu nesse dia tão tradicional.

Resolvo deixar tudo de lado. E por um minuto viajo novamente entre meus sonhos. Todos coexistindo, sentindo uma alegria sem fim, aqueles que buscam os sonhos, encontram. Outros que necessitam de um emprego, empregados. Eu que quero gritar, gritando...

As faces já não são mais as mesma, só o que figura nelas são um largo sorriso e isso me satisfaz. Agora posso voltar as minhas tarefas diárias, sinto por um pequeno instante platônico que o meu dever começa a ser feito e por que não um dia realizado?
Agora vem a tarefa mais árdua, arregaçar as mangas e colocar em prática, começando por um sorriso, segurando a mão de uma criança para atravessar a rua e a cada vez indo mais e mais longe, para um dia, ao deitar em minha cama poder refletir e chegar a conclusão, os meus sonhos saíram de dentro do meu travesseiro.

segunda-feira, março 13, 2006

O medo do Poeta..

O poeta olha a folha em branco à sua frente e esforça-se em imaginar suas intenções em palavras. Elas são o seu mecanismo de comunicação, seu aparelho celular universal que possui conexão direta com a alma dos seus leitores. Esse vínculo é essencial para que seja ouvido e entendido da maneira que ele deseja ser. No entanto, ele não quer facilitar o trabalho, essa nunca foi a intenção e é por isso que encontrar as palavras corretas é tarefa tão difícil. As palavras devem disfarçar o verdadeiro sentido, a verdadeira intenção, devem carregar seu real significado sem nunca deixá-lo à mostra, devem tramar contra a compreensão para que só leitores realmente especiais conheçam a verdade, que nada mais é que o próprio espírito do poeta.
O poeta teme entregar o ouro antes do tempo. Teme que como num clichê de filmes de ação, a poderosa arma “caia em mãos erradas”. Quando ele escreve, aquilo que diz é direcionado a alguém (ou alguéns) em especial. É como se o poema fosse uma carta aberta que pode ser lida por qualquer um e no entanto entendida apenas por aquele a quem é destinada. É uma mensagem cifrada cuja chave descansa na compreensão de apenas duas pessoas: O remetente e o destinatário.
Noite e dia o poeta passa escrevendo suas cartas cifradas, esperando ansiosamente que alcancem seu destino, e quando isso acontecer, que sua voz possa ser ouvida e entendida pelos ouvidos para os quais elas falam. A solidão dessas noites e dias é sua companhia, sua inspiração. É no solo árido da dor que cultiva as doces palavras de amor que um dia espera ter a coragem de enviar àquela que é a dona de todos os seus pensamentos. Enquanto esse dia não chega, é em sombras que mergulha essas palavras, escrevendo o seu amor quando escreve o mundo, a vida, suas verdades e suas mentiras. Codificando o amor em tudo o que diz, em tudo o que é.
O poeta é um grande covarde. Seu grande medo na verdade é o de não ser compreendido.

domingo, março 12, 2006

O menino e eu


Certa vez desceu dos céus um Deus
Não o Deus Criador, mas o Deus Filho
Ele trouxe a paz e o infinito
Trouxe o amor e a Sua glória sagrada

Mas não veio como um Deus onipotente
Veio como algo mais que uma criança
E menos que um adulto qualquer
Era abençoado e belo
Uma criança nem calma nem danada
Era somente normal e normal era
Um bom menino apenas comum

Mas de vez em quando o pegava por aí
Roubando frutas dos pomares vizinhos
Fazendo o gado mugir de espanto
Indo a lugares proibidos e vendo de tudo
Quando o surpreendia ficava assustado
E com sua doce voz me consolava
De meus triunfos tentados e a pouco feitos

Como era tolo eu; mas com Ele ninguém deve
Pois é um Senhor muito grande e bom
Tal como convém a mim se calar diante de tal
Ele é um Deus forte, e eu alguém que relata em papel
Relata algo sem valor e importância, um espelho
Faço refletir o que já existe e invento o impossível
Cabe a mim ser eu e estar dentro de mim sempre
Compor uma vida sob minhas maiores dores
Fazer de minhas fantasias desejos completos
E não falhar novamente quando escrever um final para meu poema

Mas quando o menino me trouxe um broto
Era broto de algo; feijão, milho, alface…
Veio a mim como se eu fosse um Rei sentado em seu trono
Abriu sua pequena e barrenta mãozinha
Do indicador ao mindinho, oh tão frágeis!
Mostrou-me então aquele broto selvagem e puro
Mas era somente uma plantinha nova e delicada
Com suas pequenas raízes ainda sujas pela terra
Aquelas folhinhas ainda crespas e de cores fortes
Era um legume… ou não, era a vida...

Ele desejava que eu visse como é lindo o que Deus dá
Uma vida! Sim, uma vida! Cheia de escolhas
Eu posso fazer dela um tudo, um grande além
Oh, como é frágil e delicada a vida, como é cheia de cores
Como é cheia de pureza e… e de vida
Desde o momento de nascer, é um dia a menos para se ir
Agora eu sei, sei disso, sei o que ele quisera dizer…

Um dia Ele se foi, sumiu dentre as nuvens e nunca mais voltou
O amei tanto como um filho que nunca tive
O amei tanto como um Pai que me faltou
Não que esteja reclamando, mas Ele completou os espaços vazios da vida
Serei sempre grato por Ele ter-me mostrado o broto
Por Ele ter-me dito da vida e do ser
Aprendi a amar e a ser sempre aceito
Ele foi a alma que já não mais vivia aqui dentro
Foi o Ser frágil, por ser fácil de se ir
Mas somente me contento com o Seu enorme poder
É um Deus, é o tudo e somente isso

De agora à sempre serei capaz de ser
Quando ele desceu dos céus minha vida lançou-se ao mundo
Quando comigo ele conviveu fui um algo de esperança e amor
Comecei a escrever um poema sem fim, tão belo e alegre
Quando ele caía, eu o recolhia…
Quando eu chorava, ele me dava vida, amor…
Quando ele chorava, somente secava suas lágrimas e…
E logo ele estava bom, pois era criança, rápido e facilmente voltava a viver
Quando eu perdia a esperança, ele me acolhia e me beijava
Nós éramos um só, eu a carne e ele a alma
Até o dia em que as nuvens o chamaram, e Deus rogou seu nome
Quando ele partiu minha vida cessou
Parei de escrever o poema infinito
Mas só então pude perceber que ele queria que eu o amasse
E que acima de tudo o esperasse com confiança, o seu retorno

Desde então recomecei a escrever
E escreverei até o dia que puder escrever
Até o dia em que Ele botar Sua mão em meu frágil coração
E disser que não mais preciso gastar minhas últimas folhas
Pois Ele mesmo entoará palavras doces de uma vida batalhada
Depois o meu livro será guardado
E aberto quando Ele achar que deve ser aberto
Aí eu não mais me conhecerei
Aí terei eu uma nova história a contar
Um novo poema a fazer
Com um único detalhe devaneio:
Esta longa e nova história
Será escrita entre as casas dos anjos
Sobre o colo confortador de Deus
Sentindo a brisa do esvoaçar do Espírito Santo
E sim, na presença do menino...
Que agora é Deus

sexta-feira, março 10, 2006

O menino do doce...

Leiam com carinho...

O galo cantou em algum lugar lá fora, mas seu canto encontrou-o acordado na velha espuma onde dormia. Gostava de acordar mais cedo que o despertador. Era como se ele, o despertador, fosse pego no meio de uma travessura. Levantou-se e foi ao banheiro do lado de fora do casebre fazer sua higiene, que consistia em escovar os dentes numa escova velha roubada do lixo de alguém, urinar e lavar o rosto na água fria da torneira “pra despertar”, não que dormiria de novo se voltasse para cama, nem que quisesse conseguiria, era apenas um hábito adquirido a muito tempo.
Entrando de volta em casa foi até a geladeira, que a anos não gelava mais nada, buscar algo pra comer. Esse era, aliás um outro hábito adquirido a muito tempo: sabia que nada iria encontrar, mas mesmo assim nunca desistia. “A esperança”, diria ele, “morre sim, mas não ainda”. Confirmado o que já sabia, pegou o uniforme do dia-a-dia (calça velha, chinelo velho, camiseta velha e uma porção de velhas esperanças escondidas bem no fundo do armário carcomido por cupins de desilusão), vestiu-se e saiu.
Tinha apenas 13 anos, e não ia para a escola. Estudara apenas até a terceira série, não entendia as letras nem os números, achava-se burro. Certo dia teve suas suspeitas confirmadas pela boca da própria professora, que tentando explicar-lhe o segredo por trás dos símbolos que segundo ela continham a palavra PATO, perdeu a paciência e, aos berros, condenou-lhe à sina da ignorância eterna. Não se entristeceu por isso. Na verdade não entendia a utilidade de se desenhar patos, gatos e ratos naqueles horríveis símbolos preto-e-branco que só faziam roubar a cor e a alma de tudo o que representavam. Resolveu que tinha coisas muito melhores para fazer além de ir àquele lugar onde seu tempo lhe era roubado.
Passava seus dias pelas ruas da grande cidade com crianças de várias idades que, como ele, decidiram procurar nos faróis e estacionamentos o sustento que não tinham em casa e a educação que não encontravam na escola. Esperava encontrar em algum desses faróis um pouco de luz que trouxesse a esperança de uma vida diferente onde letras e números fizessem sentido, onde deixaria de ser quem era para tornar-se alguém que tivesse importância. Cansara-se de ser só mais um dentro de casa e também fora dela. Tudo o que recebia no entanto era vidros, caras e portas fechadas.
Hoje era mais um dia desses em que o futuro parece correr rápido demais na nossa frente, numa velocidade que não conseguimos alcançar jamais. Saíra de casa de manhã bem cedo procurando algo para comer e até então nenhuma boa oportunidade lhe sorrira. Tudo o que conseguira foram algumas moedas que, numa padaria, só serviram para aumentar ainda mais a fome que sentia. Resolveu então que iria terminar o dia guardando carros nas ruas ao redor de um Shopping próximo.
O ser humano tem uma propensão incrível para o egoísmo e o preconceito. Andamos pelas ruas como se num castelo de espelhos onde tudo o que vemos é nós mesmos, tratando as outras pessoas como componentes de um cenário criado especialmente para nos satisfazer. Se algo não nos agrada, principalmente no que diz respeito à aparência, nosso preconceito encarrega-se de ignorar por completo esse componente.
Era assim que se sentia na maior parte do tempo: Um componente defeituoso no cenário da sociedade como um todo e que, como tal, era ignorado e deixado de lado.
Sentado na calçada enquanto outras crianças brincavam e conversavam à sua volta, pensava em como a muito tempo não recebia o sorriso gentil de alguém, quando viu subir a rua vinda do Shopping uma mulher. Absorta em seus pensamentos, trazendo na mão um sorvete recém comprado, quase não o viu ao passar por ele. Seu carro estava estacionado numa vaga próxima e enquanto ela abria a porta, o menino se aproximou:
“Tia, tem um dinheiro aí?”
Ela, meio assustada respondeu rapidamente, a velha ladainha:
“Nossa, não tenho não. Que pena...”
Não esperava mesmo por uma resposta diferente. Tentava se acostumar ao não, para que o sim tivesse um sabor ainda melhor. No entanto, algo estava diferente. Essa moça parecia que realmente sentia o fato de não ter dinheiro para lhe dar. Ela não era como as outras pessoas para quem costumava pedir. Viu em seus olhos uma preocupação e um amor com os quais não estava acostumado e isso o deixou sem reação. Sem saber porque, pediu:
“Me dá um sorvete?”
Um sorriso nasceu no rosto da mulher. Um sorriso de alguém que decide fazer o bem.
“Claro! Toma! É seu..”
Ela lhe estende o sorvete que acabara de comprar. Ele não consegue reprimir o sorriso e agradece com satisfação. Era bom sentir que pelo menos naquele momento alguém se importava com ele. Sorvete algum jamais teria o mesmo sabor que aquele. Se despediram e a mulher entrou no carro com uma expressão de quem tinha feito o que podia para ajudar.
Ele sentiu-se feliz e chamando as outras crianças que por ali brincavam, dividiu o presente que acabara de receber. Sentiu a necessidade de passar para frente aquele ato de generosidade. Daquela mulher e do preconceito e egoísmo que não viu em seus olhos, com certeza jamais se esqueceria.
Foi para casa pensando que o mundo pode ser diferente, melhor e que o futuro talvez não fosse assim tão ruim.
Imaginou que letras formariam a palavra “obrigado”.


“O importante não é fazer-mos muito, é fazer-mos o que podemos.”

Abraços!!!

domingo, março 05, 2006

Até onde chegaremos?


Tia, me dá um doce? O garoto com um sorriso singular pergunta à moça que passa na calçada. Ela sensibilizada entrega ao menino o sorvete que acabara de comprar e sai caminhando. Durante o caminho, começa a pensar... Será que é realmente necessária essa constante guerra do capitalismo? Enquanto alguns enriquecem, muitos estão aí pedindo de porta em porta um pouco de comida, deixando de lado a sua diginidade e se humilhando perante sua nação, perante o mundo. Quando não encontram alguém que possa dar algo para comer, buscam em lixos ou roubam. Isso me entristece e me faz pensar, até onde chegaremos? Essa busca incensata por dinheiro, trazendo conflitos entre as nações, preocupando pais, entristecendo filhos sem perspectiva... Pessoas sonham com um dia melhor, onde poderão ter uma mesa farta, onde no Natal, dia que celebramos o nascimento do Filho do Criador, se deliciarão com o tradicional Peru e seus aconpanhamentos tão desejados... É a esperança que mora dentro do coração de muitos e a mesma que não existe nos corações de outros. Por que fechamos os olhos para tudo o que acontece ao nosso redor e que nos diz respeito?? Por que subimos as janelas do carro quando alguma criança vem pedir dinheiro? E quando cruzamos com um mendigo na rua, por que mudamos de lado na calçada? Eu posso fazer a minha parte, você a sua... Precisamos parar de pensar somente no nosso bem estar e começar a pensar que devemos cuidar do mundo onde vivemos... É possível sim um lugar melhor. Para isso é necessário lutar, mas não com armas que tiram sangue do nosso próximo e sim com a arma mais eficiente que conheço, o amor. Deixar de ser frio... Sentir, sensibilizar... Isso é urgente e necessário.

Reflexões

Isso é a solução? Não talvez seja o problema. Que solução? Que problema? Calma. Não procure um sentido, uma linha de raciocínio nessas palavras. Virgulas? Provavelmente você vai encontra-las em lugares errados.O que é errado? O que é certo? É tarde, está chovendo. Raios cortam o céu desenhando lembranças na neblina que cobre a noite. Quem eu sou hoje, quem eu fui à uma hora atrás? Será que sou a mesma pessoa? Não.O ser humano e como a fênix. Renascendo a cada minuto, a cada hora, pronto para um novo vôo um novo canto. Mais uma hora se passa mais um pássaro surge das cinzas. Você não é mais o mesmo, ocorreram mudanças, mais uma nova cicatriz.Na carne? Não. Na vida. Marcas profundas, bons momentos, lembranças, pessoas, a garota do ônibus e o menino com seus malabares. Está tudo ai em algum lugar na sua mente, na sua vida. Você se esqueceu de um sorriso, de um abraço porem se lembrou de uma dívida. Olhe para o simples, de valor as pequenas coisas, abandone a sua mania de grandeza e o seu ego inflado. Cuidado uma hora ele explode. Sorria você está sendo filmado. Chore, cante, dance, ria enfim não aprecie a vida com moderação.

sexta-feira, março 03, 2006

Coqueiros Irmãos



A noite vai. O dia vem. Por detrás das montanhas escuras, a aurora surge lentamente, embalada pelos primeiros raios do sol. Cada segundo passado descortina uma beleza que talento humano algum poderia conceber. Linhas avermelhadas riscam o turvo azul do céu dando-lhe um aspecto inexplicavelmente belo. O mundo inteiro parece parar. Os ponteiros do relógio da vida movem-se devagar, para que meus olhos não percam nenhum detalhe.
Tenho de repente a sensação de que algo incrível está por acontecer. Um certo ar de apreensão paira ao redor. É mais ou menos como se o mundo à minha volta se tornasse um enorme teatro e o espetáculo estivesse na iminência de começar. Ao longe, na exata linha horizontal que separa terra e firmamento, as formas ainda negras, mas facilmente reconhecíveis de cinco coqueiros irmãos se destacam na paisagem. A cena é de uma simplicidade bela, única. As cinco árvores solitárias desfrutam dos melhores assentos da casa, tendo uma visão privilegiada do show. A aurora surgirá em poucos minutos, e eles serão os primeiros a apreciá-la. Sua visão me faz pensar rapidamente em como as pessoas que amamos nos bastam. Como é só com elas que desejamos estar quando a vida, a natureza, Deus, nos arrebata com seu incrível poder de maravilhar.
Minha atenção é desviada quando um pássaro cruza o céu à minha frente, voando vagarosamente em direção ao infinito. Percebo que muitos outros cantam em vozes, lindas canções de bom dia, empoleirados nas copas das árvores próximas. Parecem querer prenunciar a beleza do dia que nasce.
A leve brisa da manhã sopra em meu rosto um cheirinho de natureza que me renova, e leva embora todos os resquícios de cansaço que ainda haviam. A sensação é maravilhosa. Estou sentado à janela do escritório em minha casa e o que meus olhos deslumbrados vêem, inspira-me os pensamentos. Penso em você, deitada em seu leito de sono sonhando sonhos dos quais talvez eu faça parte.
“Quanta pretensão”, você me diria.
“Quanto amor”, eu me desculpo. Queria você aqui comigo, mas ficaria eternamente feliz em fazer parte nem que apenas dos seus sonhos.
O céu agora está claro. O sol já desponta por trás das montanhas, trazendo-me um mundo de esperanças ao coração. Os cinco coqueiros irmãos permanecem no mesmo lugar, parados ali como sempre estiveram: Sozinhos, com os melhores assentos da casa e muito bem acompanhados.